O empreendedorismo sempre é visto como uma opção de geração de renda em períodos de crise. Com a chegada da pandemia do coronavírus no Brasil, milhões de brasileiros escolheram esse caminho para sobreviver. Em 2020, o país registrou mais de 2,6 milhões de novos microempreendedores individuais (MEI), a maior marca dos últimos cinco anos, mas isso não foi o suficiente para segurar a taxa de empreendedorismo no nosso país. A crise atingiu vorazmente negócios que já estavam estabelecidos.
O relatório da Global Entrepreneurship Monitor (GEM) 2020, realizado no Brasil pelo Sebrae em parceria com o Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBPQ), que é considerada a maior pesquisa de empreendedorismo do mundo, nos apresentou um reflexo mais forte do que esperávamos. As pesquisas de impacto da pandemia que temos realizado há mais de um ano, em parceria com a FGV, já demonstravam que o faturamento estava em queda, em alguns casos chegando até 70%, e as empresas com grandes dificuldades de se manterem abertas. A GEM nos apresentou um reflexo ainda pior.
Em 2020, a taxa de empreendedorismo total no Brasil caiu 20% e atingiu o menor patamar dos últimos oito anos, motivada, principalmente, pela saída de empreendedores mais antigos e experientes do mundo dos negócios. Apesar da taxa de empreendedorismo inicial, aquela que mede os negócios com até 3,5 anos, ter apresentado um ligeiro aumento passando de 23,3% para 23,4% e atingindo a maior taxa histórica da série que teve início em 2002, a forte redução na quantidade de empreendedores estabelecidos, os que empreendem há mais de 3,5 anos, derrubou a taxa total, ao passar de 16,2% para 8,7%, uma redução de quase 50%. Ao fim, o número de empreendedores estabelecidos ficou abaixo do registrado em 2004.
A queda nos empreendedores estabelecidos ocorreu em todo o mundo, mas no Brasil ela foi mais forte e fez com que o país fosse o detentor de uma das maiores queda entre as 46 nações que participaram desse estudo, em 2020. Com essa enorme saída de empreendedores experientes do mercado, caiu a qualidade do empreendedorismo no nosso país, o que traz efeitos deletérios para a nossa economia e para a geração de empregos.
Em 2020, ganhou força o empreendedorismo individual e por necessidade. De acordo com o relatório da GEM 2020, o número de empreendedores iniciais motivados por necessidade saltou de 37,5% para 50,4%, o mesmo nível de 18 anos atrás, e 82% dos entrevistados alegaram que a motivação para começar um negócio foi a solução encontrada para ganhar a vida porque os empregos estão escassos. Já o empreendedorismo nascente, aquele que tem no máximo 3 meses em operação e inclui quem ainda não abriu mas está fazendo algo para abrir um negócio , cresceu 25% e atingiu o maior patamar da série histórica, com uma taxa de 10,2%. Um grupo que pode ser chamado de filhos da pandemia, aqueles que começaram seu negócio pós pandemia e, em sua maioria, foram para o caminho do empreendedorismo por uma extrema necessidade de obter renda.
Esses resultados nos mostram a necessidade de políticas públicas que amparem os donos de pequenos negócios, que ampliem a oferta de crédito, que reduzam a burocracia e que prorroguem o pagamento de impostos ou que até mesmo concedam moratória. Os empreendedores que ainda têm fôlego para lutar bravamente pelas suas empresas não podem ficar desamparados.
Nesse cenário, a importância do Sebrae se firma mais ainda. Pois além de trabalhar para que sejam criadas políticas públicas que deem amparo para 99% das empresas brasileiras, a instituição exerce um papel fundamental na educação e na capacitação desses milhões de empreendedores que nasceram por necessidade em 2020. E desde o início da crise, o Sebrae concentrou esforços para atender esse milhões de novos empreendedores disponibilizando capacitações online e gratuitas e trabalhando por programas de crédito que também atendam esse público.
*Por Carlos Melles, Presidente do Sebrae