Tecnologia a serviço da alimentação saudável

 

Amante da natureza e especializado em tecnologia, Wladimir Freitas abraçou o empreendedorismo como missão de vida. E depois de abrir uma franquia da TOTVS (empresa de sistemas de gestão) em Natal, com mais quatro sócios, resolveu investir numa nova paixão: agricultura orgânica. “Quando tive a oportunidade de aprender sobre agricultura orgânica, descobri uma paixão que é antes de tudo um entendimento e reconhecimento do poder maior da nossa mãe natureza”, afirma Wladimir, com entusiasmo. 

Auxiliado pelo SebraeLab, incubadora de startups do Sebrae/RN, ele criou o iFARM, empresa que vende produtos orgânicos através de um aplicativo de smartphone (disponível em iOS e Android). A compra do Sítio Passarinho, em Pium, em 2013, uma viagem ao Canadá, em 2017, e grandes marcas do setor de tecnologia como Amazon, Uber, Google, iFood e Mercado Livre foram suas fontes de inspiração. Cerca de R$ 470 mil reais e um ano de atividades depois, o app foi concebido. Nesta entrevista, Wladimir fala um pouco mais sobre a nova empresa, sua paixão pela natureza e alimentação saudável, e muito mais: 


Como surgiu a ideia da startup iFARM?

Eu já havia iniciado o projeto do Sítio Passarinho, desde 2013, e também já tinha sofrido as mesmas dificuldades dos pequenos produtores, que vão desde o planejamento da produção até a comercialização. E a comercialização sempre foi a parte mais complicada. Então, numa viagem que fiz ao Canadá, em 2017, tive a oportunidade de ver como funcionava lá essa “conexão” entre o produtor local e a comunidade. E vi que aquele modelo poderia funcionar aqui no Brasil também. Fiz diversas ações focadas na melhoria da comercialização juntamente com outros produtores que passavam pelos mesmos problemas e quando estava tudo mais formatado pensei em desenvolver um sistema para resolver isso – da produção à comercialização, tudo integrado –, pois só reduzindo custos em toda a cadeia, o produtor poderia receber mais, enquanto o cliente pagar menos. Quando o Sebrae/RN, através do SebraeLab, abriu inscrições para o edital de impacto social, eu vi ali a oportunidade de apresentar o IFARM. O projeto foi um dos cinco classificados e acelerados durante 2018.


Quanto tempo levou da ideia até a criação e funcionamento da empresa?

A ideia já estava concebida desde o final de 2017 quando voltei do Canadá, mas não tinha recursos financeiros para investir sozinho no projeto. Quando fomos “acelerados” pelo SebraeLab aí a ideia se transformou em projeto. Somando tudo, levamos 12 meses para escrever o projeto, desenvolver o MVP (produto mínimo viável) e lançar no mercado a primeira versão do aplicativo em dezembro/2018. 


Quanto foi investido, tanto na concepção do app quanto na aquisição do local para a produção dos produtos orgânicos (ou ecológicos)?

Se dividir o projeto em todas as suas fases, teremos: 1) Produção: R$ 315.000,00 - desde a aquisição das terras (5 hectares em Pium), infraestrutura básica, e o plantio comercial (do ano 1 até o ano 5); 2) Pesquisas e cursos: R$ 33.000,00; 3) Desenvolvimento do aplicativo e softwares de gestão: R$ 122.000,00. Total: R$ 470.000,00.


Quais produtos são comercializados? 

São comercializados produtos orgânicos, através da nossa parceria com produtores certificados pelo IBD (empresa certificadora) e produtos agroflorestais em processo de certificação. Esses produtores locais, nos quais o Sítio Passarinho se inclui, contam com o apoio do Sebrae/RN, tanto na preparação - com consultoria de certificação – quanto no processo de certificação.


E onde são produzidos? Qual a localização? 

Os produtores atendidos pelo iFARM estão em sítios, concentrados na região da Grande Natal. Temos produtores em Macaíba, Cajupiranga e Nísia Floresta. São pequenos empresários, profissionais liberais ou aposentados, vindos da cidade. Pessoas que buscam um estilo de vida mais saudável, sustentável e mais próximo da natureza.


Como são conservados os produtos, principalmente frutas e verduras, para evitar perdas depois da colheita?

Como sempre entendi que o melhor alimento é aquele colhido na hora, ali, na horta, minha preocupação foi começar pelos produtores mais próximos de Natal. Hoje, no iFARM, recebemos os pedidos, distribuímos o que cada produtor tem que colher, mandamos um veículo buscar os produtos em cada sítio, fazemos a seleção e embalagem e saímos para as entregas. Tudo isso, ocorre das 6h às 17h do mesmo dia. Essa logística arrojada é necessária para que as perdas sejam zeradas, ou seja, só colhemos o que foi efetivamente vendido. O produtor elimina as perdas da colheita e o consumidor recebe um produto colhido no dia. Essa é a fórmula que buscamos otimizar para garantir melhores preços, para o produtor e para o consumidor.

 

Orgânicos geram R$ 4 bilhões de faturamento no ano passado

O mercado brasileiro de produtos orgânicos faturou no ano passado R$ 4 bilhões, resultado 20% maior do que o registrado em 2017. Os dados são do Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável (Organis), que reúne cerca de 60 empresas do setor.

O Brasil é apontado na pesquisa como líder do mercado de orgânicos da América Latina. Contudo, quando se leva em consideração a extensão de terra destinada à agricultura orgânica, o país fica em terceiro lugar na região, depois da Argentina e do Uruguai, e em 12º no mundo.

Na América Latina, a produção se estende por oito milhões de hectares, o que corresponde a 11% da área mundial destinada aos orgânicos. Em extensão de terra, o Brasil cresceu mais de 204 mil hectares em dez anos, atingindo, em 2017, de 1,1 milhão de hectares.

Mercado Global
O mercado global de orgânicos, sob a liderança dos Estados Unidos, Alemanha, França e China, movimentou o volume recorde de US$ 97 bilhões, em 2017. O balanço é da Federação Internacional de Movimentos da Agricultura Orgânica (Ifoam).

De acordo com a federação internacional, estão identificados cerca de 3 milhões de produtores orgânicos em um universo de 181 países. A agricultura orgânica cresceu em todos os continentes atingindo área recorde de cerca de 70 milhões de hectares.

Fonte: Agência Brasil

*Com informações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

 

E qual a periodicidade da colheita, depende do tipo do produto?

A colheita ocorre toda segunda, quarta e sexta-feira. Todos os produtos disponíveis no aplicativo são previamente, confirmados com os estoques disponíveis dos produtores. Às vezes, ocorre – como recentemente, onde tivemos chuvas fortes em Natal – de perdemos alguns produtos (folhosas, principalmente). Mas tem sido raro os casos de quebra de estoques.


Como os produtos são empacotados para entrega? Há preocupação com o meio ambiente?
 
Depois de pré-higienizados, os produtos são embalados em sacos plásticos. Já estamos estudando alternativas mais sustentáveis – como a folha da bananeira, por exemplo –, mas isso ainda passa pela aceitação do cliente. Precisamos incluir nessa fase uma mudança cultural nossa. Para reduzir o impacto ambiental, todas os pedidos são embalados em caixas de papelão retornáveis. Já os produtos congelados, seguem em caixas térmicas até a casa do cliente e retornam para os produtores, na nossa logística reversa.


O serviço de entrega em domicílio só pode ser feito através do aplicativo?

Sim, até por ser mais prático para o cliente. Mas, caso o cliente não queira usar o app, podemos, sim, atender pelo whatsapp e por telefone, também.


O serviço de entrega está disponível 24 horas, de domingo à domingo?

Os pedidos no aplicativo podem ser feitos 24 horas por dia, 7 dias por semana. Já as entregas são feitas todas as segundas, quartas e sextas-feiras.


Entrega apenas em Natal?

Natal e Parnamirim. Criamos uma rota virtual que vem de Pium, passando pela zona sul de Natal e indo até a Ribeira. Imaginamos essa rota, cruzando a cidade pelos bairros que são cortados pela Avenida Salgado Filho e Avenida Prudente de Morais.


Há projeto de expansão do serviço?

Sim. Estamos analisando o banco de dados e cruzando as informações de vendas, desde o início do iFARM, para definirmos os próximos passos. Podemos abrir nossa primeira loja física ou ampliar os dias e rotas de entrega. Tudo vai ser definido assim que terminarmos as análises.


O serviço funciona via aplicativo, disponível para Android e iOS?

Sim. Ambos estão disponíveis para download. Temos apenas um cuidado extra com a loja da Apple (iOS) pois o aplicativo está cadastrado nas buscas como “iFARM Estilo de Vida”. Dessa forma, se acha mais fácil. Já no Android, “iFARM” já está com mais de mil downloads e aparece no topo das buscas. 


Como conciliar as atividades da iFARM com a TOTVS, empresa de tecnologia à qual o senhor é sócio? 

Para trabalhar no iFARM, eu tive que delegar as tarefas executivas da franquia TOTVS para meus sócios. Isso já funciona há mais de dois anos e estou certo que fiz a melhor escolha.
  

A formação na área de tecnologia facilitou a criação do serviço?

Sim. Hoje, entendemos que não existe negócio promissor sem um forte alicerce de TI (tecnologia da informação). Para definir o modelo de negócio do iFARM avaliamos empresas como Amazon, Uber, Google, iFood e Mercado Livre. Cada pedacinho dessas empresas, inspiraram de alguma forma o nosso negócio.


Por que consumir produtos orgânicos (ou ecológicos)?

Que os agrotóxicos são realmente prejudiciais a saúde da terra, dos animais e das pessoas, isso todos nós já sabemos. O alimento é a base da constituição do nosso corpo e da nossa saúde. A própria energia vital que existe nos alimentos (e que não vemos) é tão importante quanto os micronutrientes e calorias que enxergamos. Não dá mais para comparar alimentos naturais, orgânicos e biodinâmicos, cultivados localmente com os produtos produzidos há dezenas de quilômetros de distância em fábricas, praticamente robotizadas. Isso está muito longe do que a mãe natureza criou para a gente. Quer um desafio? Não olhe mais para o seu alimento como algo “só para matar a fome”. Essa é a menor parte dos benefícios do que você come. Experimente olhar para seu alimento e se perguntar: “o que esse alimento vai trazer para meu corpo, minha alma e meu espírito”. Garanto que essa consciência mudará seus hábitos alimentares.


O mercado de startups já é uma realidade na região ou ainda é uma tendência?  

É uma tendência local, mas uma realidade mundial. Criar uma startup, com apoio de uma incubadora ou aceleradora, ajuda muito ao empresário que deseja não só validar sua ideia, mas, principalmente, coloca-la no mercado com maiores chances de sucesso.


Como empreendedor de sucesso, qual a sua avaliação sobre a economia do país e do Rio Grande do Norte para 2019?

Com um novo governo, sempre se renovam as esperanças de mudanças para melhor. Tanto o Brasil como o Rio Grande do Norte precisam de ajustes na economia, bem como no ecossistema do empreendedorismo. As pequenas empresas são as maiores geradoras de empregos e consequentemente de impostos. Acredito que os governos devem se posicionar como elo de ligação entre a produção e o consumo. Se essa interação for facilitada, o próprio mercado se ajusta. Com tanta informação disponível em tempo real, o consumidor é o maior interessado e crítico de empresas, produtos e serviços.  


Que mensagem gostaria de deixar para quem deseja começar ou seguir com uma alimentação mais saudável?
 
Quando tive a oportunidade de aprender sobre agricultura orgânica, descobri uma paixão que é antes de tudo um entendimento e reconhecimento do poder maior da nossa mãe natureza. Àquela lei universa, de que “é dando que se recebe” passa a fazer todo sentido. Ao deitar uma semente no solo, você humildemente fica de joelhos, né? E ao cuidar dessa semente durante algum tempo, sua recompensa é multiplicada 100... 1.000 vezes. Acho que nós, humanos, precisamos olhar mais para as coisas simples e voltar a aprender com as plantas e os animais. Existe um equilíbrio perfeito e um “cuidar um dos outros” tanto nas florestas, como nas colmeias e nos formigueiros. Nessa visão, ser mais “bicho” e menos “humano”, seria uma ótima oportunidade de “resetar” nossa visão lógica e material do mundo e aprender a agradecer por cada pequena coisa que engrandece as nossas vidas.   


 

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