Muito se fala em governança corporativa dentro do padrão ESG, sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança. É um modelo visto como verdadeiramente sustentável porque, além das preocupações financeiras, administrativas, técnicas e legais, ele se preocupa também com os impactos que as atividades empresariais causam na natureza, como o aquecimento global, e no cotidiano dos cidadãos (qualidade de vida, respeito à diversidade, entre outros). Mas um levantamento feito pela BR Rating, primeira agência de rating de governança corporativa do Brasil, mostra que ainda falta muito para que as empresas alcancem esse nível de excelência, principalmente no que tange ao Social da sigla.
Apenas 3,5% das corporações têm mulheres atuando como CEOs, uma prova de que ainda há muitas barreiras no mercado corporativo para a ascensão delas. A pesquisa também aponta que os homens ocupam 84% dos cargos de diretoria e as mulheres 16%, enquanto os cargos gerenciais contam com 81% de homens e 19% de mulheres. Outro dado curioso é que 42% das companhias afirmaram ter apenas homens no quadro de executivos, 56% contam com homens e mulheres e apenas 2% têm somente mulheres na equipe de comando. O percentual médio de mulheres no quadro total de executivos é de 23%, o que implica também em diferenças salariais. Em empresas de varejo, produtos de consumo e comunicação as mulheres ganham 7,5% a menos, em média. Em setores como mineração, siderurgia, metalurgia, construção civil e engenharia a diferença média salta para 23%.
A pesquisa envolveu 486 empresas, sendo 59% de capital nacional e 41% multinacionais. Deste total, aproximadamente 40% são listadas na Bolsa de Valores e pertencem a setores variados da economia. Empregam de 200 a 10 mil funcionários, sendo que 8% faturam acima de R$ 25,81 bilhões, 18% entre R$ 5,41 bilhões e R$ 25,8 bilhões, 11% entre R$ 2,71 bilhões e R$ 5,4 bilhões, 19% entre R$ 1,21 bilhões e R$ 2,7 bilhões, 18% entre R$ 501 milhões e R$ 1,2 bilhão e 26% até R$ 500 milhões.
Ronald Bozza, sócio da BR Rating, explica que essa é a primeira pesquisa de gênero feita pela empresa. Ele concorda que ainda há um longo caminho a ser percorrido para que a diversidade seja uma realidade no mundo corporativo. “A diversidade é um item importante na composição do modelo ESG. E quando digo diversidade não me refiro apenas às mulheres, mas também aos LGBTQ+. Por que só homens e mulheres heterossexuais? Os outros grupos também têm inteligência e sagacidade empresarial para contribuir fortemente para o crescimento das corporações”, afirma Bozza.
O executivo da BR Rating, no entanto, acredita que há uma evolução no mercado, mesmo que tímida. “Se fizermos um novo levantamento em 2022, acredito que haverá mais mulheres em posição de comando. Elas já ocupam posições de destaque nos Conselhos de Administração. Aos poucos elas crescem e se empoderam. Quanto aos LGBTQ+, muitas companhias ainda não estão preparadas para esses grupos, mas já começa ocorrer uma pequena movimentação neste sentido. Esse caminho deverá ser um pouco mais longo”.
Um exemplo de empresa que ganhou muito com uma mulher no comando é a Vá de Táxi, plataforma que só atua com taxistas e que se reinventou em boa parte devido ao trabalho e à visão de mercado de sua CEO, Glória Miranda. À frente da plataforma desde novembro de 2019, ela comanda a transformação do aplicativo que está deixando de ser apenas de mobilidade para se tornar uma plataforma de serviços.
Com a concorrência de aplicativos de motoristas e a queda na demanda por causa da pandemia, os taxistas tiveram grande perda de renda. A saída foi agregar serviços diferenciados. Cerca de 200 taxistas de São Paulo, integrantes da Vá de Táxi, receberam treinamento para prestar serviços a clientes de seguradoras como trocar pneus, recarregar baterias, entre outros. A ideia foi bem sucedida e em breve será expandida para outras capitais. Além de expandir para outras localidades, Glória já trabalha na ampliação do leque de serviços a serem prestados. Os taxistas também serão treinados para serviços residenciais como trocar sifão de uma pia, instalar uma prateleira e trocar torneiras.
“Assumi a Vá de Táxi com um objetivo muito claro, que era expandir a empresa, não só no corporativo, que sempre foi nosso foco, mas também para o mercado pessoa física. Durante a pandemia, a gente teve de repensar nosso modelo de negócios e expandimos não só para mobilidade, mas também para o mercado de serviços. Uma experiência sensacional”, afirma Glória. A executiva se mostra preocupada com os dados da pesquisa. Apenas 3,5% das corporações terem mulheres no cargo de CEO é para ela um número alarmante.
“Isso envolve uma mudança na composição dos conselhos de empresas: que majoritariamente são formados por homens, e acabam não indicando mulheres para cargos de CEO nestas empresas. Há também, a questão da maternidade, já que a mulher se afasta temporariamente do trabalho e depois tem dificuldades para se recolocar”, afirma, completando: “O terceiro ponto é disparidade salarial: até hoje mulheres em cargos semelhantes a homens, seguem recebendo menos por realizar mesmas atribuições."
Mesmo sendo presidente de uma empresa, Glória ainda se vê em situações em que tem que reafirmar a homens o quanto ela é capaz. Ela cita como exemplo uma reunião com empresas parceiras em que outros executivos perguntavam como que uma mulher jovem podia ser CEO de uma companhia. “Eu respondi que isso foi possível com muita humildade, perseverança e busca de conhecimento. Foi o que fiz durante minha trajetória. Eu me formei em duas faculdades, busquei ajuda de mentores e mentoras e agora estou aqui. E quero preparar mulheres e também homens para mais para frente assumirem meu lugar porque a diversidade é essencial para o sucesso de uma empresa”, conclui.