Bruno Campos, CMO da AdsPlay
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“O Dilema das Redes” – Preciso deletar minhas redes sociais?

 

Lançado em setembro pela Netflix, o documentário O Dilema das Redes debate o papel das redes sociais na sociedade atual e como elas podem influenciar nas tomadas de decisão e afetar toda uma cultura. Um dos temas mais falados no filme é o algoritmo de personalização e como essa tecnologia pode se adaptar de acordo com o nosso perfil e oferecer produtos e publicações que tenham a ver com o universo e interesse de cada um.Mas afinal, é assim mesmo que funciona? Ou ainda, isso é algo ruim ou que pode sair de controle em algum momento?

Para começar a falar sobre automação e personalização, é importante lembrar que o relacionamento entre o universo dos poderosos algoritmos das empresas de tecnologia e nosso dia a dia, é relativamente próximo e de longa data. Vamos voltar para 1997, ano do lançamento do que conhecemos hoje como Google Search. Na época, as ferramentas de busca eram bem diferentes do que conhecemos hoje. Ter um buscador que usava as pesquisas dos usuários para personalizar suas repostas e entregar um resultado cada vez mais preciso, era algo bem inovador. Na época, um dos maiores desafios da recém-criada empresa era entender o que estava por trás daquelas palavras-chave e descobrir se pesquisas como “white house” estavam buscando resultados sobre uma casa pintada de branco ou sobre a sede do governo americano. Mais de 23 anos se passaram e, hoje, o algoritmo usa milhares de variáveis como pesquisas prévias, localização geográfica, padrões, idiomas, gírias, entre outros fatores, para entregar um resultado de busca mais relevante.

Isso não foi diferente com as redes sociais. Ao perceber que as pessoas tinham mais de mil amigos e viam uma quantidade de publicações finitas em sua timeline, as empresas tiveram que criar algoritmos de classificação que selecionassem o que a pessoa veria no dia. E, com base nas interações, interesses e proximidade com seus amigos, ir constantemente ajustando aquela “seleção do dia”. Afinal, seria inviável alguém ver tudo sobre todo mundo que seguimos a cada 24 horas. Certo?

Por fim, não posso de deixar de citar a mídia programática. Ela foi criada como uma alternativa para se automatizar a compra de mídia – que antes era feita de maneira manual e através de telefonemas e reuniões. Com isso ganhamos agilidade, escala e a possibilidade de ter um ecossistema aberto onde podemos conectar plataformas e algoritmos que fazem a compra dessa mídia em tempo real. Mais do que isso, acrescentamos machine learning nesse fluxo o que nos permite personalizar anúncios e histórias e, com o aprendizado de cada dia, enriquecer e melhorar a jornada online do consumidor na web. Ou seja, não só melhoramos o modelo de compra de mídia, como também, democratizamos o acesso ao espaço publicitário.

E lembram do problema das redes sociais de selecionar as melhores histórias com base em cada perfil? Ou ainda, dos buscadores de saber exatamente o que as pessoas queriam saber com as palavras-chave? É exatamente isso que os algoritmos de programática resolvem, mas com a escala de estar desde seu aplicativo de áudio favorito até os sites em que você navega. Conectando diariamente marcas e consumidores no imenso e turbulento oceano que é a internet.

E aí que gostaria mostrar um lado não abordado pelo Dilema das Redes.

Antes de mais nada, sim, gostei do documentário. Foram 90 minutos de entretenimento e reflexão (ok, algoritmo do Netflix, você me pegou nessa!). No entanto, acho que a direção do filme aponta muito a luz sobre algo negativo e perigoso e generaliza como se o problema fosse a tecnologia e o meio. E não, como as pessoas usam isso. Robôs são extremamente habilidosos e precisos em tarefas repetitivas. Mas eles (ainda), não são criativos ou geram ideias inovadoras. Portanto, se uma tecnologia está fazendo algo com um objetivo específico, provavelmente existe um humano por trás daquele direcionamento. Por exemplo, quando a própria Netflix me sugeriu que eu assistisse o filme, foi um claro direcionamento do algoritmo entendendo que, do catálogo de lançamentos, eu teria uma grande probabilidade de aceitar aquela sugestão e gostar do conteúdo. Isso gera maior engajamento para a plataforma e faz com que eu entenda que ela me gera valor, justificando manter minha assinatura.

Quando nós, como executivos de marketing, pedimos mais performance e ROI nas nossas campanhas, estamos tendo um claro direcionamento de queremos que aqueles anúncios sejam otimizados para pessoas com maior probabilidade de compra e que, de certa maneira, incentivem àqueles que tem vontade de adquirir um produto ou serviço a comprar de fato. E, ao menos na minha humilde opinião, não há problema algum nisso.

Lembro de um professor na faculdade que sempre falava que, no dia que ele pudesse escolher pelas pessoas, seria o profissional mais poderoso do mundo – e que isso não passava de uma utopia. No entanto, também dizia que o trabalho de um profissional de marketing é entender quem pode gostar da sua oferta, gerar valor para ela e tendo um consentimento das duas partes, fazer a troca desse valor. Momento que acredito ser um dos mais especiais no marketing.

O que muda no marketing digital, que cada vez está mais conectado com dados e tecnologia é que conseguimos nos apoiar em algoritmos que testam milhares de cenários e probabilidades, para se ter uma entrega mais assertiva e criar o tal valor do marketing.

Fake News

Dilema das Redes também aborda a questão das fake news. Em primeiro lugar é preciso frisar que não são as empresas responsáveis pelas redes sociais que criam as notícias falsas; são as pessoas. Combater as Fake News é uma missão difícil, mas o primeiro passo desse processo é entender que os algoritmos não foram criados para propagar fake news mas sim, para gerar engajamento. Esse tipo de notícia tem alto potencial viral e de interação e, de certa maneira, acaba se aproveitando da estrutura desses algoritmos para propagar.

Acredito que, do mesmo jeito que evoluímos tanto nos últimos anos com algoritmos de recomendação, o mesmo pode acontecer de maneira inversa. Talvez a tecnologia seja a resposta para se combater fake news de maneira efetiva. E já temos exemplos disso. Em campanhas de mídia programática é possível colocar filtros de Brand Safety que vão desde análises prévias de conteúdo até uma classificação de aplicativos pela nota média que os usuários lhe deram na app store.

Costumo trabalhar com um processo de proteção baseado em camadas. Batizamos ele de Brand Safety Onion. Que consiste em usar um misto de análise humana e de algoritmos para garantir que nossos clientes não sejam associados a notícias falsas ou discurso de ódio. Mais uma vez, a mesma tecnologia, fazendo um papel diferente do que vimos no filme.

Deletar as contas nas redes, te deixa protegido?

Como foi citado nesse texto, não há necessidade de se proteger quando o assunto são anúncios segmentados. O principal intuito dos algoritmos que “classificam conteúdo” é o de tentar entregar o que for mais relevante para quem está do outro da tela e ter sua atenção.

O que acontece é que, como em várias coisas no mundo, muitos indivíduos se aproveitam de um sistema para propagar notícias falsas, tentar influenciar decisões, entre outras coisas. Acredito que é muito mais sobre ter consciência de tudo isso do que tentar viver alheio à tecnologia e ao que ela pode proporcionar de positivo em nossas vidas.

Portanto, é importante colocar luz nesse tema e auxiliar as pessoas mais vulneráveis como crianças e jovens ou ainda, pessoas que não tem tanta intimidade com a tecnologia a entender que é importante checar fontes, não acreditar em tudo que se vê e sempre questionar porquê estamos fazendo algo. O documentário da Netflix levanta um debate importante mas que tem que ser feito com os dois lados da moeda.

Novas regras de segurança entram em pauta: minha mãe sempre me disse para não entrar em carros de estranhos, veio a Uber e quebrou essa regra. Todavia, em um mundo cada vez mais tecnológico surgem novas regras e cuidados que precisamos tomar. E com isso em mente, a tecnologia pode ser algo muito, mas muito, positivo.

Bruno Campos - CMO da AdsPlay

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