Alto custo das passagens aéreas gera debate em Natal

 

Ruim para quem precisa viajar à trabalho ou de férias, péssimo para o turismo local. Este é o sentimento de passageiros e empresários do setor turístico do Rio Grande do Norte, com o alto custo das passagens aéreas cobradas em Natal, tanto na ida quanto na volta. "O Rio Grande do Norte é o destino mais caro não só do Nordeste, mas do Brasil", esbraveja Abdon Gosson, presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens (ABAV-RN).

Diante da situação, ainda sem uma solução, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Rio Grande do Norte - Fecomério/RN, resolveu lançar no início de abril o Radar de Tarifas Aéreas Fecomércio RN. Trata-se de um monitoramento diário dos preços dos voos que chegam a Natal, vindos dos principais polos emissores de turistas do país: Belo Horizonte (MG), Brasília (DF), São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ). A ferramenta também faz um comparativo dos valores destes mesmos voos chegando às capitais dos estados vizinhos ao Rio Grande do Norte (João Pessoa, Recife e Fortaleza).

Os dados estão disponíveis no site da Fecomércio/RN (www.fecomerciorn.com.br) e no Portal do Turismo (tradeturisticorn.fecomerciorn.com.br). “Com o Radar de Tarifas Aéreas, queremos deixar à disposição da população um levantamento que retrate de maneira fidedigna o contexto de nossas tarifas aéreas”, explicou o presidente da Fecomércio/RN, Marcelo Queiroz. A fonte dos dados publicados no Radar de Tarifas é o Google Flights, levando em consideração o menor valor, independente da companhia aérea.

As autoridades também protestaram. Recentemente, o deputado estadual Hermano Morais (MDB) propôs uma audiência pública com agentes do Governo do Estado, empresários do setor turístico, representantes da Inframérica, concessionária que administra o Aeroporto Internacional Aluízio Alves, jornalistas, economistas e população em geral.

Os altos custos praticados para se chegar e sair de Natal de avião, segundo Hermano Morais, atingem pelo menos 52 atividades ligadas ao turismo. O parlamentar entende que a melhor forma de se fomentar a atividade turística, nesse momento, é indo buscar a redução no valor das passagens. “O RN vem perdendo, nos últimos tempos, muitos passageiros. A rede hoteleira tem sido obrigada a reduzir suas tarifas. As passagens são muito mais baratas em Pernambuco e Ceará, até na Paraíba. Um completo absurdo e sem explicação”, argumentou Hermano. “Houve a redução de 17% para 12% no ICMS sobre o querosene de aviação, mas não houve contrapartida”, criticou o parlamentar estadual.

Durante a mesma audiência pública, Ana Costa, secretária de Turismo do RN, afirmou que a “falta de conectividade do ‘destino Rio Grande do Norte’ e os altos preços das passagens aéreas” são os maiores problemas para solucionar, no momento. “Os operadores não conseguem vender mais os nossos destinos”, lamentou Ana Costa. "Precisamos nos mobilizar para combater os preços abusivos e ampliar as opções de voos para o nosso estado, que é um dos destinos mais procurados do Brasil", alertou o deputado federal Beto Rosado (PP), durante a audiência pública, na Assembleia Legislativa do RN. 

Um documento foi encaminhado pela Assembleia Legislativa à presidência da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR), solicitando uma nota técnica que possa explicar os motivos dos altos preços praticados nas passagens aéreas do Rio Grande do Norte, em comparação, inclusive, a estados vizinhos da região Nordeste do Brasil.

Políticos e empresários do trade turístico numa só voz
A Câmara Municipal de Natal também promoveu uma audiência pública para debater o tema. A propositura foi do presidente da Casa, vereador Paulinho Freire (PSDB), que ficou de enviar aos representantes das empresas aéreas, os principais pontos discutidos durante a audiência. Além disso, ele sugeriu ao Senado Federal agilidade para aprovar matérias que tenham a intenção de quebrar o monopólio das companhias aéreas.

"Sofremos com uma concorrência desleal que prejudica o turismo, um setor de suma importância com grande cadeia produtiva. Queremos dar nossa contribuição e cobrar para que as tarifas aéreas possam baixar. Temos um aeroporto moderno com incentivo de ICMS para o querosene da aviação para as empresas e queremos chegar a um denominador comum", disse Paulinho Freire. Os vereadores Ana Paula (PSDC), Felipe Alves (MDB), Raniere Barbosa (Avante), Dinarte Torres (PMB) e Klaus Araújo (SD) também defenderam medidas que venham a reduzir os preços das passagens.

O secretário de Turismo de Natal, Fernando Fernandes, defendeu a união da classe política e relatou como a cidade deixa de gerar empregos em virtude do problema. "Temos uma indústria do turismo gigantesca, mas com um terço da capacidade produtiva ociosa, ou seja, são cerca de 30 mil leitos, dos quais dez mil não estão sendo ocupados. Numa conta rápida, são 2.420 empregos que deixam de ser gerados", revelou.

Representantes do trade turístico aproveitaram a audiência pública na CMN para ampliar o coro de protesto dos vereadores e demonstraram como o preço das passagens afasta turistas e prejudica toda a cadeia produtiva. "Estamos cada dia perdendo mais voos e com isso as passagens ficam caras. Não conseguimos compreender as razões e, por isso, é importante estarmos discutindo para juntos conseguirmos resolver", sugere Diassis Holanda, presidente do Conselho da ABAV (Associação Brasileira de Agências de Viagens). 

Presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis – ABIH/RN, José Odécio Júnior reafirma o que o vereador Paulinho Freire havia colocado na audiência pública: abertura de capital das empresas aéreas. "É fato que existe um monopólio em que empresas aéreas ditam os preços. Só há uma saída: permitir que empresas aéreas sejam abertas para o capital externo. E assim, quebrar o monopólio”, aposta o dirigente.

Aeroporto Aluízio Alves também vira alvo de críticas 
Em meio ao debate sobre o preço das passagens aéreas, o aeroporto construído especialmente para a Copa do Mundo de 2014 também virou alvo de críticas. "Eles ainda não mostram pra que veio. Não tenho visto participação da Inframérica em nada. E isso me preocupa muito", especula José Odécio, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis - ABIH/RN. "Lamento que isso seja o comportamento de uma empresa privada, que parece se comportar como uma empresa pública”, arremata.

Gestora do Aeroporto de Brasília, a Inframérica também é acusada pelo presidente da ABIH/RN de se dedicar mais às operações do terminal da capital do país, em detrimento da capital do Rio Grande do Norte. "Infelizmente, a Inframérica não tem feito nenhuma ação para promover o estado. A impressão que eu tenho é que eles esqueceram o Rio Grande do Norte e se dedicam apenas à Brasília", critica Odécio Júnior.

O superintendente do aeroporto, Ibernon Gomes, rebateu, indiretamente, as críticas que a Inframérica vem sofrendo, explicando que o terminal não possui responsabilidade em torno do problema: passagens caras. Ele informou que o aeroporto não tem qualquer influência negativa em relação às altas tarifas cobradas pelas empresas aéreas em Natal.

“Estamos abertos para dialogar e colaborar da melhor forma possível para que o cenário mude”, afirmou Ibernon. De acordo com ele, a tarifa cobrada no aeroporto de Natal é a mais barata do Brasil, custando R$ 22,21 - em João Pessoa, por exemplo, essa tarifa é de R$ 25,89. Apesar disso, as passagens com destino ao Rio Grande do Norte ou de saída do Estado pelo terminal são consideradas as mais caras do país, segundo levantamento da Fecomércio/RN e da Associação Brasileira das Agências de Viagens (ABAV/RN). 

Ibernon revelou que o estado perdeu cerca de 200 mil passageiros nos últimos cinco anos, se comparado com os números do antigo aeroporto de Natal, localizado em Parnamirim. “O (aeroporto) Augusto Severo recebia 2,6 milhões de passageiros por ano, enquanto nós, com uma estrutura muito maior, recebemos 2,4 milhões”, disse Ibernon Gomes.

Apesar da redução no número de passageiros, apontada pelo próprio Ibernon, em 2018 o Aeroporto de Natal (chamado assim pela própria Inframérica, mesmo estando localizando no município de São Gonçalo do Amarante) movimentou cerca de 2.43 milhões de passageiros e mais de 19 mil aeronaves. O crescimento tímido de 1,1% em relação à 2017 é reflexo da retomada lenta da economia, segundo a concessionária. 

A movimentação do terminal de cargas ficou acima da expectativa em 2018, de acordo com dados da própria Inframérica. O aeroporto movimentou 15,7 mil toneladas, finalizando o ano com um aumento de 27% em relação à 2017. A principal remessa do terminal continua sendo a exportação de frutas e peixes para a Europa. O Rio Grande do Norte é o maior exportador nacional de peixes das espécies atum e meca, com 26% da fatia total exportada. Já as frutas, mamão, manga e melão equivalem a 70% das remessas. 

E mesmo diante das constantes reclamações de passageiros em relação ao atraso nos voos domésticos (recentemente, a Avianca, que anunciou um Plano de Recuperação Judicial, virou o principal alvo das críticas), a Inframárica chama a atenção para a pontualidade das operações em 2018. Segundo a concessionária, dos mais de 19 mil pousos e decolagens que ocorreram durante o ano, 90% estavam dentro do horário.

O Aeroporto de Natal encerrou 2018 premiado como o melhor aeroporto da categoria pequeno porte e o melhor aeroporto do Nordeste, conforme pesquisa realizada pelo Ministério dos Transportes que ouviu a preferência dos passageiros. 

Isenções fiscais precisam ter contrapartidas das companhias
Representantes do Governo do Estado afirmam que já estão discutindo junto às companhias aéreas a redução nos preços das passagens. O secretário de Desenvolvimento Econômico, Jaime Calado; o secretário de Tributação, Carlos Eduardo Xavier; e a secretária de Turismo, Ana Costa, garantiram que as isenções fiscais vão ter contrapartidas.

“Precisamos amarrar as contrapartidas. A concessão de 12% não tem nenhum tipo de amarra. Esse é o principal problema da redução do ICMS do QAV concedida no estado. Nossa conversa é no sentido de que queremos fomentar o turismo do Rio Grande do Norte. O modelo não funcionou, com perda de arrecadação e sem o retorno. Queremos construir um novo modelo para fomentar a indústria do Turismo e que também colabore com os natalenses que querem viajar”, explicou Carlos Eduardo Xavier.

Para buscar modificar o cenário, além da discussão diretamente com as empresas, a classe política potiguar solicitou ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) uma investigação sobre a situação. Representante do órgão, João Aurélio Braga já confirmou que o Cade vai investigar com prioridade este caso das passagens aéreas no RN. 

Passagens aéreas no RN até 217% mais caras, segundo pesquisa
Segundo dados da Fecomércio/RN, os voos com destinos a Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília são mais caros partindo de Natal do que de Recife, Fortaleza e João Pessoa. Em um levantamento realizado em março deste ano, as passagens envolvendo a capital potiguar são entre 46% e 217% mais caras do que os outros destinos comparados. 

Já o levantamento realizado pelo jornalista Octávio Santiago, especialista do setor do turismo, comparando diretamente com João Pessoa, que tem uma realidade econômica mais próxima de Natal, os voos são 22,5% mais baratos na capital paraibana. Mas, essa diferença pode chegar até 112%. “Na hora que uma pessoa de São Paulo vem a Natal, com um preço mais alto na passagem, a diferença está sendo bancada pela hotelaria e pelos demais serviços. É uma transferência de renda direta de toda a população do RN para os cofres da companhia”, avaliou o empresário do setor turístico, George Costa.

Voos Charters
Enquanto as autoridades e os representantes do trade turístico tentam encontrar uma solução para reduzir os preços das passagens no Rio Grande do Norte, Natal comemora a volta de voos charters da Europa. Depois de uma ação promocional em parceria com o Governo do Estado e a Prefeitura de Natal, as entidades ligadas ao turismo potiguar conseguiram efetivar dois voos com frequência semanal da companhia Corendon, partindo da Holanda, a partir de novembro deste ano.

O empenho para colocar Natal na rota dos europeus novamente foi muito elogiado pelo presidente da ABIH/RN, José Odécio Júnior. "Tivemos total apoio do Governo, da Prefeitura e da Fecomércio. Espero que tenhamos a partir de agora uma política de Estado e não de Governo para o turismo, que para se consolidar precisa do apoio de todos os envolvidos". 

Para viabilizar os voos europeus, serão investidos 1,5 milhão de euros, com uma contrapartida de 100 mil dólares da Prefeitura de Natal e 200 mil dólares do Governo do Rio Grande do Norte. "O investimento em voos deste tipo ajuda, e muito, a movimentar a economia do estado, gerando emprego, negócios e impostos", aponta Odécio. 

Os dois voos semanais devem trazer cerca de 380 turistas holandeses e belgas. Para passar uma semana em Natal, o turista deve desembolsar algo em torno a 280 euros. Natal já chegou a ter uma média de 18 voos charters semanais, antes da crise de 2008.

 

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